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Maio/2015 – A TS-E 24mm f/3.5L II é uma de quatro objetivas especiais na linha Canon com movimentos “tilt” e “shift”. Próprias para arquitetura, estas lentes conseguem projetar a foto fora do eixo central no plano de imagem, distorcendo as linhas da composição para compensar outras distorções de perspectiva, que o fotógrafo nem sempre pode corrigir. E também mudar o ângulo que a imagem é projetada, para mudar a profundidade de campo sem mexer na abertura. (english)
Digamos que você queira fotografar um prédio de 30 metros de altura a partir da rua. Com uma lente normal, assim que você aponta a câmera pra cima, as colunas parecem “cair” sobre o ponto de fuga, dando uma aparência triangular a construção. Uma solução para deixar as linhas retas seria fotografá-lo de frente, mas nem todo mundo tem uma grua de 15m para fazer isso, certo?
Entra o movimento de shift (“deslocamento” em inglês). Com ele você consegue descentralizar o plano focal (lente) do plano de imagem (filme ou sensor), compensando o enquadramento sem sair do lugar. Desta forma é possível pegar o prédio inteiro a partir do chão, sem que as linhas pareçam “cair”. O “shift” cria uma distorção na imagem que parece “corrigir a perspectiva” de uma foto comum, ideal para fotografar arquitetura com aparência mais natural.
Já o tilt (“inclinação” em inglês) é mais complicado de entender, mas juro que é fácil. Numa objetiva comum, a imagem do plano focal (lente) é projetada paralelamente ao plano de imagem (filme/sensor), para garantir nitidez de ponta a ponta do quadro. É desta forma que conseguimos focar em distâncias diferentes e também controlar a profundidade de campo.
Com o tilt, você consegue mudar o ângulo que o plano focal será projetado sobre o plano de imagem. Como o plano focal se “alinha” numa área maior/menor do plano de imagem, o que parece em foco pode ser “alongado” sem mexer na abertura! É perfeito para fotografar paisagens com longa profundidade de campo em f/stops modestos, evitando por exemplo a difração. Ou diminuir a profundidade de campo mesmo em f/stops altos, como f/8.
É muito útil para fotografar produtos com longa profundidade de campo sem fechar a objetiva e compensar na exposição. Ou diminuir a profundidade de campo em cenas distantes, para criar o famoso “efeito miniatura”. As TS-E da Canon conseguem fazer os dois movimentos tilt e shift juntos, para uma infinidade de ajustes e compensações diretamente na objetiva. E na geração II a orientação de cada um pode ser fixada de forma independente, para ainda mais flexibilidade. Vamos ver de perto o que esta lente faz? Como é a construção e a qualidade de imagem? Se preparem para mais um equipamento essencialíssimo, e boa leitura!
A primeira coisa a entender sobre as “TS-E” é que não estamos falando de uma “EF”. “TS-E” significa tilt-shift eletronic, objetivas que tem os movimentos tilt e shift e abertura eletrônica, diferente das “EF” electronic focus. Sim, você entendeu certo: as TS-E não são EF e não tem foco automático. Mesmo com os movimentos zerados, o tamanho e o preço, a Canon não (e nenhum outro fabricante) colocou um motor AF nestas lentes. O tipo de fotografia a que elas se destinam não precisa de foco rápido, e por isso elas não substituem as EF, pensadas para o dia a dia.
Segundo, as TS-E são facilmente reconhecidas por aí por causa dos botões e filipetas espalhadas no corpo. Os knobs servem para controlar os movimentos e as filipetas “soltam” a construção da objetiva para mudarmos a orientação: shift de cima/baixo para esquerda/direita; e tilt também de cima/baixo para esquerda direita. E nesta geração II, a Canon criou a primeira TS-E com movimentos híbridos: você consegue usar o tilt e o shift em qualquer posição e orientação, junto, separado e combinado. É uma contorção fenomenal que nenhuma outra fabricante oferece.
Por causa disso o projeto de 780g tem 88.5x107mm de puro metal, exceto os knobs para resposta tátil melhor no frio. Do mount ao anel de foco, tudo é gelado e firme, sem qualquer balanço ou espaço para “emperrar” os movimentos. O design é sóbrio, robusto e totalmente L. Mas tomem cuidado para não sair jogando-a em qualquer mochila, porque os botões de ajuste são frágeis e custam uma fortuna para consertar na assistência técnica, se tiverem as peças…
Na frente o anel de foco manual é gigantesco e tem marcações de distância gravadas, do foco mínimo de 21cm até o infinito, em pés e em metros; não há janela de distância. Nada expande durante a focagem o que permite o uso com filtros de ø82mm na frente, grandes apesar do projeto óptico não ser tão ousado (estamos em f/3.5, afinal). A função é evitar vinheta com os movimentos que podem deslocar a objetiva num círculo de projeção quase 4x maior que a 24mm normal.
No geral a operação é relativamente simples depois que você entende para que a objetiva serve e o que ela faz. Com os dois movimentos zerados nós podemos inclusive usar as chaves “lock” para usá-la como uma lente comum, apesar do foco manual. Tomem cuidado para não forçar os knobs de movimento se a objetiva estiver travada. Repito, é caro trocá-los se você quebrar. É uma obra de arte da Canon que justifica o preço pela construção. Se você trabalha com fotografia de produtos e arquitetura, as TS-E da série L são “as ferramentas” para ter no kit.
Com 16 elementos em 11 grupos, um asférico e três UD, na geração II, abertura f/3.5, status L e “specialty lens”, não era de se esperar menos que a perfeição da TS-E 24mm f/3.5L II. E desde o lançamento ela ganhou fama como a melhor 24mm “full frame” da Canon em termos de correção de aberração cromática (não há), distorção geométrica (não há), e por um tempo de resolução topo de linha (foi superada pela zoom EF 24-70mm f/2.8L II USM). Temos outro clássico na linha: fotos com contraste perfeito, cores tipicamente Canon, e a alta resolução de sempre.
Eu já superei a fase de ficar testando lentes de “abertura máxima até f/8”, e sinceramente não notei qualquer deficiência nas minhas imagens. De ponta a ponta do quadro os detalhes estão lá. As texturas de asfalto, concreto, pinturas, enfim, os sujeitos tradicionais da fotografia de arquitetura, são bem reproduzidos e nítidos, bem além de primes de grande abertura (em f/stops ousados) ou zoom low cost. E o contraste é alto, bacana para brincar com a luz e sombras, independente do horário do dia ou da iluminação local. * Todas as fotos com a EOS 5D Mark II.
Com os movimentos tilt e shift também não há diferença na performance óptica. Mesmo em shift máximo não aparecem distorções esféricas, erros de alinhamento das cores (aberrações cromáticas), perda de nitidez etc. Quem faz “tilt shift” com free lensing (objetiva fora do mount), não consegue o mesmo resultado: vira e mexe as fotos saem com flaring e borradas. Nas TS-E não: o resultado é profissional e pronto para imprimir, sem riscos a qualidade de imagem.
Destaque vai para o “bokeh” quando usamos o tilt para diminuir a profundidade de campo. Independente da abertura, o desfoque fica suave e colorido, sem repetição de linhas e contraste alto. É interessante para conseguir looks “intimistas” de alianças, flores, detalhes, mesmo com uma objetiva f/3.5. Um estilo que eu uso pouco mas vocês podem experimentar.
Por US$1899 o custo da TS-E 24mm f/3.5L II deve ser visto como um “investimento”. Não é uma objetiva para todos os dias porque é grande, pesada e com foco manual. Mas para fotógrafos que trabalham com arquitetura e produtos, é uma peça invejável no kit, que não irá desapontar. Nem vale a minha recomendação: quem precisa, já tem uma. :-) Boas fotos!