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Fevereiro/2014 – Uma objetiva fixa 50mm de grande abertura com certeza está na lista de desejos da maioria dos fotógrafos entusiastas que tem uma DSLR. Popularizadas nos anos 80 por fazerem parte dos kits padrão, as cinquenta milímetros viraram referência do “look” com profundidade de campo curta em grandes aberturas e campo de visão próximo do olhar humano, agradável para retratos. Hoje, seja pela boa relação custo/benefício destes modelos, ou qualidade de imagem que só as primes entregam, uma hora você também terá uma cinquentinha no kit. (english)
E os fabricantes, ah, os fabricantes, estarão mais que felizes em oferecer opções para todos os tipos de fotógrafos, necessidades e bolsos. Só na Canon atualmente são quatro modelos EF, três deles com especificações muito parecidas: a básica f/1.8II, a intermediária f/1.4 USM, e a topo de linha f/1.2L USM, de excelente construção. Todas entregam quantidade de luz pelo menos 7X maior (a partir do f/1.8) que as zoom de kit (por exemplo 18-55mm f/5.6 em 50mm) e valem a pena para fotografias com: baixa luminosidade, sem flash; efeitos de profundidade de campo curta em abertura máxima; e retratos de meio corpo para cima, aplicação típica desta distância.
A Canon EF 50mm f/1.4 USM demorou para entrar no meu kit porque eu já tenho a EF 50mm f/1.8II, minha primeira prime qual aprendi a usar este tipo de abertura; e porque eu também já tenho a EF 50mm f/1.2L, indispensável para o meu trabalho de gravações semanais por sua construção sólida, aparentemente inquebrável. Sem planos para colocar uma outra objetiva “inferior” na mochila (caminho comum para quem já tem as séries L), a versão intermediária caiu no esquecimento e não tive grandes oportunidades de pegá-la emprestada para o review do zack.
Mas isto mudou numa viagem recente para os Estados Unidos e encontrei a f/1.4 USM aos montes nas lojas Best Buy, por um preço irrecusável: US$319 no modelo atual, com embalagem preta e branca, e a nova tampa do tipo pinça. Aproveitei e comprei uma, sem pensar duas vezes. Enfim, vamos ver o que eu achei da irmã do meio “esquecida” da família Canon; o que ela faz bem, o que ela faz mal; compará-la com objetivas parecidas, discutir qualidade de imagem e construção; e concluir se a EF 50mm f/1.4 USM vale ou não vale para colocar também no seu kit. Boa leitura!
Lançada em 1993 para o sistema EF, a 50mm f/1.4 USM é baseada no mesmo design óptico da FD 50mm f/1.4 de 1971 (7 elementos em 6 grupos), mas renovada com sistema eletrônico de foco por motor ultra-sônico e abertura eletrônica controlada pela câmera. É dos projetos mais antigos ainda em fabricação nesta marca e mostra um gap enorme da Canon entre as gerações de equipamentos, que ficam décadas no lineup sem ver melhorias. Outras japonesas já trouxeram suas objetivas para a modernidade, como: Nikon AF-S Nikkor 50mm f/1.4G, projeto de 2008, com 8 elementos; e a nova (e absurda) Sigma 50mm f/1.4 DG HSM, com 13 (!) elementos de vidros especiais, ambas melhores construídas e com desempenho óptico superior a esta Canon quase-jurássica.
Com 290gr e 5cm de comprimento, a EF 50mm f/1.4 USM é o que podemos chamar de objetiva compacta. Montada nos corpos full frame ela equilibra muito bem e o conjunto fica agradável nas mãos, com boa pegada na câmera com a direita e na objetiva com a esquerda. Nos corpos crop o pacote fica ainda menor e é possível fotografar com uma mão só, sem se preocupar com peso para frente ou segurar a objetiva com a outra mão. Infelizmente o hood não está incluído na caixa e não sei dizer se influência na usabilidade. E o modelo que eu comprei, com caixa preta e cinza, inclui a nova tampa frontal do tipo “pinça”, mais fácil de tirar do corpo que a antiga.
Essa leveza se deve ao corpo ser de plástico, tanto no tubo externo quanto no tubo interno. E embora o mount seja de metal e passe segurança em inúmeras montagens/desmontagens, infelizmente não posso afirmar o mesmo do resto da construção. Vejam, sem querer ser chato, mas os ajustes balançam demais. Basta segurar a objetiva nas mãos e estender o tubo interno até o foco mínimo que parece a peça estar solta! Fazia tempo que eu não pegava uma objetiva nas mãos que passasse a impressão de “produto de segunda linha” e é o que a EF 50mm f/1.4 USM passa; lembrando que temos a f/1.2L USM no topo da cadeia e a EF 50mm f/1.8 II lá embaixo. Ou seja, não me surpreende a Canon estar entregando de fato um produto, nem tão bom nem tão ruim.
E o mesmo raciocínio foi usado na implementação do motor USM. No lugar do “micro motor” da f/1.8 II pindaíba, você ganha um “micro motor USM”, que é ultra-sônico e menos barulhento. Mas não é tão rápido (nem totalmente silencioso) quanto o “ring USM” da f/1.2L USM. Pelo menos ele oferece o full time manual e sem mexer no botão AF/MF (único do corpo) você pode compensar qualquer erro do sistema automático através do anel de foco manual, que é grande e confortável, mas com feedback ruim de plástico com plástico. Não espere grande precisão já que ele tem um jogo bem grande entre girar o anel e girar o tubo interno.
Enfim os filtros na frente são de 58mm e típicos das 50mm tradicionais. Não giram enquanto o sistema foca e permitem o uso de polarizadores, por exemplo. O diafragma é de oito lâminas e totalmente eletrônico, fecha até f/22; mas não fica redondo e entrega um bokeh inferior a f/1.2L. Resumindo, fica evidente que a Canon escuta a sua equipe de marketing passo-a-passo na hora de desenvolver os produtos. “Teremos três objetivas no mesmo segmento? Então a primeira não será melhor que a segunda, e a segunda não será melhor que a terceira.” Uma pena já que este modelo é reconhecido pela boa qualidade de imagem e não custa barato.
A mais você leva na f/1.4 USM o mount de metal, mais suave e durável para montar/desmontar da camera. Ganha janelinha de distância e anel de foco maior. O micro-motor USM, mais rápido e menos barulhento, com modo manual o tempo todo (não precisa mexer o botão). E 1/3 de stop a mais de luminosidade, que é imperceptível na profundidade de campo, com sistema de oito lâminas no diafragma (contra cinco na f/1.8 II); o bokeh é mais suave na f/1.4 USM. Mas você perde no preço (mais que o dobro) e no tamanho. Na minha opinião o investimento vale a pena na 50mm f/1.4 USM para quem ainda não tem nenhuma prime 50mm, logo de cara.
O topo de linha da Canon tem construção absolutamente impecável, praticamente a melhor 50mm AF fabricada hoje. É todinha de metal com extremidades de plástico, weather sealing total (quando um filtro estiver na frente), motor ring USM extremamente rápido e silencioso, além do diafragma de oito lâminas redondas com bokeh cremoso em qualquer abertura. Mas custa cerca de cinco vezes mais que a EF 50mm f/1.4 USM e não entrega muito mais em performance. Minha sugestão da f/1.2L USM é para quem trabalha diariamente com o equipamento e não pode “cuidar” na hora de guardar e ficar trocando as objetivas o dia todo. A série L foi feita para isso: trabalho.
Embora vocês já estejam carecas de saber que a decisão na compra de uma objetiva vem da distância focal que você precisa, muitos tem dúvidas entre esta 50mm f/1.4 USM e a 85mm f/1.8 USM; e não se comparam. A 85mm tem sistema AF interno e totalmente quieto, ambos USM. A 85mm tem bokeh acentuado por razões óbvias de distância focal, então fará fotos totalmente diferentes. E a 85mm é maior, mais pesada e delicada, apesar de bem construída. É o caso de escolher qual você precisa primeiro, e nunca “entre as duas”.
Renovada em 2008 é o primeiro projeto novo Nikon 50mm f/1.4 desde a década de 70. Também é todinha de plástico, mas muito mais robusta e com weather sealing. E o kit ainda inclui hood e bolsa para transporte, pelo mesmo preço da Canon. Como produto vale muito mais que a objetiva EF e a qualidade de imagem é ligeiramente superior, notável principalmente nas aberturas próximas da máxima. O sistema de foco das duas é muito bom, mas a Nikon não faz tanto barulho e o anel manual é muito melhor de pegada. A Nikkor é um trunfo deste fabricante; na Canon só temos isto pagando pela f/1.2L USM, que custa mais. Já passou da hora de atualizar a EF f/1.4.
Depois do mimimi sobre a construção, só resta a qualidade de imagem como argumento a favor da EF 50mm f/1.4 USM. E o projeto de 1971 se mostra valente até hoje, sem dúvidas. É lógico que totalmente aberta em f/1.4 esta objetiva mostra a idade e características típicas das grandes aberturas: blooming, CA de todos os tipos, astigmatismo e perda de resolução nas bordas. Estes problemas são vistos fora do plano focal e a objetiva exige uma focagem precisa para evitá-los.
A vinheta, que é aquele escurecimento das bordas causado tanto pelo desenho físico da objetiva quanto por elementos ópticos que fazem sombra uns nos outros, é pronunciado em abertura máxima e na verdade causa personalidade as imagens, trazendo o destaque para o que estiver no centro do quadro. O efeito criativo é bacana para fotos intimistas ou detalhes, e pode ser resolvido logo a partir de f/2.8, que usará somente o “miolo bom” da objetiva sem o problema.
A abertura f/2 já melhora consideravelmente a resolução no quadro todo e as bolhas ao redor de pontos de luz somem quase por completo. Na minha opinião é o melhor stop com relação “quantidade de luz/qualidade de imagem” e serve como porto seguro para arquivos que serão impressos em grande formato. O f/1.4 tem problemas e é “artístico”; o f/2.8 é perfeito mas pouco luminoso. Então o f/2 é o melhor dos dois mundos sem grandes problemas ópticos.
De f/2.8 em diante a nitidez já fica exemplar em toda a imagem e imbatível para as objetivas zoom que não chegam aos pés deste tipo de qualidade. Absolutamente todos os detalhes da cena serão reproduzidos até nos sensores digitais mais exigentes das câmeras crop, e nas bordas do full a maioria dos problemas desaparecem. f/4 em diante só serve como controle da quantidade de luz e profundidade de campo, e em f/8 nós temos uma das objetivas mais nítidas da linha Canon EF.
A cinquentinha f/1.8 II infelizmente mostra o design simplificado e inferior quando comparada a uma versão maior, mais cara, como a f/1.4 USM. A nitidez totalmente aberta das duas é diferente e precisamos fechar mais a f/1.8 para chegar nos mesmos patamares da f/1.4, o que não é de se estranhar. Mas principalmente o look geral das imagens envolvendo cores e contraste é muito superior na irmã do meio, o bokeh é melhor; então minha recomendação é para investir logo de cara na f/1.4 USM deixando a f/1.8II somente para restrições severas de orçamento.
A grande f/1.2L USM nunca foi reconhecida pela qualidade de imagem e isto fica claro em comparação a f/1.4. As imagens das duas são virtualmente idênticas e às vezes vemos astigmatismo muito mais pronunciado na versão maior, dependendo do ângulo de entrada de luz na objetiva. De f/2 em diante fica muito difícil colocar a série L como “superior” então minha recomendação fica para a construção de metal e bokeh ainda mais suave.
Demorou mas a EF 50mm f/1.4 USM chegou ao meu kit, e para ficar. A construção sobreviveu a uma viagem tensa (chuva e tira-põe na mochila) e as fotos valeram a pena. O sistema AF foi confiável na EOS 5D Mark II usando o ponto central, e rápido; fiz fotos de dentro do taxi que seriam perdidas por exemplo na Sigma 35mm f/1.4 DG HSM. No geral esta é a melhor 50mm Canon considerando preço e imagens: não é tão simples e de bokeh “duro” quanto a f/1.8 II, nem tão sofisticada e cara quanto a f/1.2L USM. Vale a pena para quem está sério sobre fotografia e monta um kit intermediário de alta qualidade, preocupado com boas imagens e o prazer em fotografar. Boas fotos!