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Fevereiro/2018 – A XF 23mm f/2 R WR é a segunda objetiva da linha “f/2 R WR” apresentada pela Fujifilm para o X-Mount. Praticamente uma “linha intermediária premium” para a fotografia de rua, apresentada em 2016 junto da câmera X-Pro 2, a proposta é manter as dimensões diminutas junto da operação tátil que só o sistema X entrega no mercado; além da performance óptica alta, num kit de objetivas primes fáceis de usar; praticamente sem concorrentes no formato APS-C. Foi assim na primeira 35mm f/2 R WR. Foi assim na terceira 50mm f/2 R WR. Agora na distância focal mais ampla de todas em 23mm, será que a Fujinon conseguirá manter no grande angular as qualidades da linha “f/2 R WR”, que ficaram de fora da diminuta 18mm f/2 R de 1ª geração (sem proteção à respingos d’água e poeira WR, além de qualidade óptica duvidosa)? Vamos descobrir! (english)
Em 5.2 x 5.9cm de 180g, mais uma vez o review mecânico de uma “XF f/2 R WR” é redundante; idêntica na 23mm às 35mm e 50mm que já vimos por aqui. Curiosamente a mais ampla delas em distância focal, não necessariamente ela é a mais curta: a 35mm f/2 é quase 1 cm menor (4.5cm) e fisicamente já temos indícios que a Fujinon não repetirá nesta 23mm o erro de projeto da 18mm f/2 R; uma das piores primes já testadas no canal, só para justificar o design portátil pancake. Longa, relativamente pesada e sólida, sem qualquer barulho de peça solta do lado de dentro, esta linha “XF f/2 R WR” realmente lembra muito a precisão da construção das alemãs Leica para o mount M “full frame”, apesar do preço relativamente baixo, graças ao formato menor APS-C. Feita de policarbonato resistente do lado de dentro, e com uma “luva” de alumínio anodizado do lado de fora, por US$449 a 23mm f/2 está longe de ser barata, mas sem dúvidas é o “produto premium” que a Fujifilm pretende para o X-Mount. Esta não é daquelas “primes de plástico” típicas do mercado “de entrada” DSLR, e você sente nas mãos o carinho da Fujfilm para com o projeto.
Nas mãos a XF 23mm f/2 R WR mais uma vez “desaparece” na frente da câmera, de tão portátil e leve que é. Aqui mostrada com a base da linha X-A3, é interessante vermos como a pegada fica quase inteira na câmera, ela apoiada pelas palmas das mãos. O dedo indicador vai embaixo de um dos anéis físicos de operação da objetiva, e tem ajuda do dedão “em cima” para girar os comandos; para esquerda ou para direita. Mais próximo da câmera está o anel físico do controle da abertura (f/stop), eletronicamente programado (não é mecânico) para ativar o motor do diafragma com clicks duros nos valores cheios (f/2, f/2.8, f/4…), e suaves nos terços (f/2.2, f/2.5…). Também notamos como este anel está montado sobre borrachas, que justificam a especificação “WR” (“weather resistance”) com vedação à respingos d’água e poeira. A Fujifilm declara dez pontos de selagem, e funciona: para fotografar os desertos de Nevada, ou as caldeiras úmidas de Yellowstone, não tive qualquer problema com areia ou umidade adentrando a objetiva.
Na frente o anel de foco manual também é eletrônico, e indica ao motor interno o ajuste do grupo de focagem. Totalmente metálico e sem cobertura de borracha, a operação deste anel também é suave por causa do WR, além de silencioso. Com quase 1 cm de espessura ele também é generoso, mais que a XF 35mm f/2 R WR que escorregava com as mãos suadas. Mas o ajuste do foco, assim como todas outras objetivas XF/XC testadas até aqui, é impreciso: há um atraso entre o comando do lado de fora e a resposta do motor do lado de dentro, e o giro entre o foco mínimo até o infinito é muito longo; realmente não estamos falando de uma objetiva mecânica como as Leicas. Por outro lado o motor de foco automático é rápido, declarado como um stepping motor pela Fujifilm, e durante meus testes com a X-T20 tudo foi praticamente instantâneo. Também para a gravação de vídeos o foco também é seguro, sem mudar de posição aleatoriamente, e tudo funciona como esperado, como todas as objetivas da linha Fujinon XF: simples, fáceis de usar, e muito portáteis.
Estabilizador interno? Não há. Anel de zoom? Também não. Enfim como toda prime, a simplicidade da XF 23mm f/2 R WR termina na rosca de filtros de ø43mm na frente, do mesmo tamanho dos filtros da 35mm f/2. Feito de metal, o “caminho” da rosca é “liso” e silencioso, preciso para não escapar acidentalmente. Sobre ele há ainda um segundo trilho para segurar o parasol incluído na caixa, fininho e discreto para não aparecer na composição ampla dos 23mm. E atrás o mount também de metal é bem acabado, protegido por uma grossa borracha de vedação entre a câmera, compatível com as X-Pro 2, T1 e T2. Mais uma jóia da Fujinon no mercado APS-C, a operação da 23mm é a mesma de todas as “novas” f/2 R WR: tudo no lugar certo, tudo simples de usar, com anéis táteis de operação apesar dos comandos eletrônicos. É a perfeita mistura do digital com a herança de 84 anos da Fuji, distinta no mercado mirrorless APS-C, sem concorrentes no mercado. Mas será que opticamente esta 23mm entrega? Tudo o que eu quero é esquecer a XF 18mm f/2 R.
Com projeto óptico de 10 elementos em 6 grupos, duas peças asféricas e coating Super EBC, a Fujifilm teve de se desdobrar para fazer na XF 23mm f/2 R WR uma “grande angular” com boa performance, preço e dimensões. Não é segredo para ninguém a dificuldade de projetar nesta distância focal, que exige objetivas longas, grandes e pesadas; tudo o que deve ficar de fora das câmeras mirrorless portáteis. Também por US$449, ficaram de fora as peças de baixa dispersão das 35mm/50mm f/2 R WR (o projeto ficaria ainda mais caro), e claramente notamos os defeitos nas imagens da XF 23mm f/2 R WR: a resolução é líder sim de ponta a ponta do quadro, graças as peças asféricas, mas nos limites do foco, dos 2 metros para baixo, a performance cai bastante. A Sony sofre com o grande angular na E PZ 16-50mm f/3.5-5.6 OSS. A Sigma teve problemas com a 19mm f/2.8 na DP1M. A Canon não faz nenhuma maravilha na EF-M 22mm f/2 STM pancake. E a Fujinon virtualmente tem a pior objetiva já testada por aqui, na 18mm f/2 R de primeira geração. A XF 23mm f/2 R WR sem dúvidas é a melhor delas, mas não melhor que uma grande angular 35mm no formato 135 “full frame” para as DSLR. Nasce então um paradoxo: recomendar a “menos pior” do mercado APS-C mirrorless, ou deixar claro os limites da física óptica das câmeras pequenas?
Não que na abertura máxima a XF 23mm f/2 R WR seja totalmente inútil. Pelo contrário, o par de peças asféricas realmente faz um trabalho brilhante em manter o astigmatismo e o saggital coma flare bem controlados, com pontos de luz “firmes” em todo o quadro, sem distorções. É fácil registramos paisagens além do foco de 10m com resolução de sobra para os exigentes sensores de 24MP das câmeras X-Mount atuais, e certamente é um passo largo à frente da qualidade oferecida pelos smartphones; as câmeras mais populares do mundo de hoje. Mas próximo do foco de 3 metros até o mínimo de 22cm, o formato APS-C já extrapola qualquer razão em prol da qualidade de imagem: os detalhes são suaves em grande parte do quadro; a profundidade de campo é curta demais para justificar o quadro amplo do angular, e as qualidades do que está fora de foco são muito ruins; dada a geometria força da fórmula. Simplesmente as imagens saem com um “look barato” incoerente com o preço de US$449: o vazamento de luz é óbvio em linhas de alto contraste; as aberrações axiais também são óbvias nos planos próximos do ponto focal; e o desfoque tem linhas repetitivas, sem suavidade. Ou seja, qualquer uso criativo é largamente impactado, e o melhor uso é somente no foco do infinito; limitando as possibilidades.
Fechar a abertura para f/4-f/5.6 tem um enorme impacto na nitidez das imagens, rivalizando com as objetivas 35mm do formato “full frame”; próprio para trabalhar com fotografias de alta precisão. Aqui testada em nas paisagens de Montana com a câmera mirrorless intermediária X-T20, fica difícil distinguir a nitidez das imagens fotografadas com a Fujinon de US$449, contra as mesmas fotos feitas pela EOS 5DS e objetivas topo de linha; todas prontas para impressões gigantes, de alta qualidade. Novamente todos os detalhes de folhas, árvores, texturas e contornos tem contraste altíssimo, apesar do formato menor APS-C, justificando o uso de uma câmera dedicada para fotografar; ao invés de um smartphone. Quase a totalidade dos reflexos internos vai embora com o diafragma fechado, e o sistema de 9 lâminas gera estrelas com 18 pontas razoavelmente firmes, visíveis lá para o f/8-f/11; perfeito para efeitos criativos com a luz no quadro. É uma performance de gente grande numa câmera pequena, e o melhor uso da XF 23mm f/2 R WR: fotos com longa profundidade de campo em aberturas pequenas, e que serão impressas no papel.
As aberrações cromáticas são curiosas no projeto, uma vez que ele exige a compensação eletrônica obrigatória nos arquivos raw; praxe comum no mercado “sem espelho” da Fujifilm e da Sony (a Canon não faz o mesmo nas objetivas EF-M). Um aviso indica a correção no Adobe Camera Raw do Photoshop, e não pode ser desligado; algum nível de processamento é aplicado. Mesmo assim, uma fina linha roxa toma conta de contornos com alto contraste na periferia do quadro, como montanhas contra o céu claro; galhos de árvores contra nuvens; e detalhes firmes de arquitetura; todos melhores registrados por sistemas ópticos maiores. Nos planos em desfoque a aberração axial também toma conta de objetos escuros contra o fundo claro, com bolhas verdes no segundo plano, e magenta no primeiro; também, independente da correção obrigatória. É no mínimo uma fraude da Fujifilm: os pixels devem ser interpolados para anular as aberrações, e perdemos nitidez nas imagens. Novamente são os limites do formato APS-C, mirrorless e grande angular, e não substitui o formato 135 full frame, com uma prime dedicada à alta performance.
A vinheta e a distorção geométrica também fazem parte do pacote de compensações eletrônicas, apesar de, mais uma vez, não serem totalmente corrigidos. A vinheta na verdade é discreta: você nota em f/2 como o escurecimento das bordas dá atenção ao centro, porém sem o look “forte” de uma EF 24mm f/1.4L II USM, nem de uma EF-M 22mm f/2 STM. Há obviamente algum nível de correção aplicado, mas não totalmente clínico, como a perfeição que vemos nos smartphones. O mesmo pode ser dito para a geometria: às vezes as imagens são totalmente planas de tão perfeitas que são mas, dependendo da composição e perspectiva, uma leve bolha pode aparecer na focagem entre os 2m e o infinito. Abaixo disto e a compensação é claramente ainda maior, e o quadro no final fica perfeito, sem linhas tortas. Ou seja, imperfeição nas paisagens, mas perfeição nas fotografias de arquitetura, dado o perfil variável de correção com a distância de foco.
Os reflexos internos também são uma característica interessante do modelo, hora bonitos, bacanas para efeitos criativos; hora terríveis, praticamente destruindo as imagens. Não é raro a fonte de luz aparecer no quadro do grande angular, especialmente em paisagens, e queremos que ela fique neutra; sem distorcer as cores e a luminosidade da cena. O coating tecnológico EBC promete transmissividade de até 99,8% da luz pelas lentes, mas nem sempre isso acontece. Quando eu queria meramente transformar o sol num ponto estrelado com 18 pontas, para usar criativamente a abertura de 9 lâminas, deu certo; nada da luz vazar pelo quadro e gerar bolhas coloridas do lado oposto à projeção. Mas em outras situações onde eu precisava que o sol ficasse neutro, atrás das árvores, uma “explosão” de reflexos internos tirou a nitidez e a perfeição esperadas para a cena. Num dos exemplos o defeito é o caos: o sol forte reflete entre quase todos 10 elementos da fórmula óptica, e parece que estamos usando uma objetiva chinesa de US$60, sem qualquer tratamento. Portanto enquadre a composição com cuidado: verifique antes do click como sairão os reflexos e corrija o enquadramento, se necessário.
Por fim as cores e o bokeh (qualidades do desfoque) vão na contra-mão do que vimos até agora no sistema Fujinon X: fortes e característicos, mas sem de fato serem neutros. O desfoque também é tão caótico quanto os reflexos: graças as duas peças asféricas, feitas para garantir resolução no quadro todo, qualquer linha firme no segundo plano é repetida duas vezes em lados opostos, dando contornos firmes à pontos de luz quando estamos no foco mínimo; ou a aparência de “vertigem” em distâncias de foco mais longas, entre 1m e 2m. Por incrível que pareça, a XF 18mm f/2 R “inferior” faz um desfoque bem mais suave, dependendo do sujeito, e não vi a mesma qualidade nesta 23mm. E as cores são o samba da Fujfifilm: vividos demais o dia todo, seja do crepúsculo ao sol a pino; longe da realidade; mas bonitas de se ver, dependendo do gosto do freguês. As fabricantes na verdade “tunam” o grande angular para isto: toda objetiva 35mm “para baixo” é bem mais saturada que as padrão (40-60mm) e as telephotos. É uma facilidade no pós-processamento, que não exige tanto boost de saturação via software, mas é fácil de enjoar. Se a razão da sua foto não for as cores, pode cansar de ver os arquivos coloridos o tempo todo.
A Fujinon XF 23mm f/2 R WR é a primeira peça que deixa a desejar na linha “f/2 R WR”, e vale o alerta: pense bem antes da compra. Enquanto mecanicamente ela seja idêntica às 35mm, 50mm e superior a 18mm (que não tem o WR, nem o foco interno), opticamente a Fujifilm ficou em cima do muro no projeto óptico, sem de fato entregar a performance que conheci nas outras duas peças mais longas, virtualmente perfeitas. O desafio é claro: uma objetiva portátil, leve e com poucos elementos, além da escolha entre vidros mais caros (ED ou asféricos?). O equilíbrio que a Fuji encontrou foi de fato na 23mm de maior resolução que eu já usei, perfeita para substituir os 35mm de uma câmera do formato 135 “full frame” e uma nova maneira de trabalhar com paisagens no grande angular. Mas qualquer situação fora desta, seja para aproveitar o foco seletivo da grande abertura, ou imagino até aos retratos em grupos (não testados), a óptica peca nos resultados. O desfoque é feio e duro. As aberrações, mesmo controladas artificialmente, continuam visíveis. E a resolução cai nas bordas, difíceis de recomendar. Portanto esta não é a “35mm killer” que esperávamos, e fica a questão: apostar na câmera menor e pior, ou continuar com a DSLR para o grande angular? Eu continuarei com a minha EOS 5DS, e recomendo que você faça o mesmo nestas distâncias focais mais curtas. Não dá para contornar as leis da física no mirrorless. E boas fotos!